As três ondas de doenças infecciosas que vão acometer o Rio Grande do Sul
As chuvas e as inundações que arrasaram o Rio Grande do Sul afetaram milhões de pessoas, deixaram centenas de milhares de desabrigados e causaram mais de 100 mortes. Mas, em termos de saúde pública, as consequências do evento climático continuarão por muito tempo — e exigirão todo um planejamento das autoridades e dos profissionais da área.
Segundo evidências colhidas a partir de outras grandes enchentes que ocorreram no mundo em anos recentes, a tendência é de um aumento importante nos casos de diversas doenças infecciosas, como diarreias, problemas respiratórios, leptospirose, hepatite A e dengue.
Os especialistas ouvidos pela BBC explicam que essas enfermidades virão em ondas, de acordo com o tempo de incubação de vírus, bactérias e outros patógenos e também devido ao tipo de exposição de risco que as pessoas envolvidas na tragédia tiveram e terão daqui em diante.
Confira a seguir que ondas de doenças infecciosas são essas e o que pode ser feito — do ponto de vista individual e coletivo — para diminuir o impacto delas.
Primeira onda: diarreias e infecções de pele
Muito do conhecimento acumulado sobre as consequências à saúde de grandes enchentes vem de países asiáticos, como Índia, Paquistão e Indonésia, que historicamente lidam com problemas do tipo.
Ao analisar diversos acontecimentos do tipo, os autores do estudo apontam que, nos primeiros dez dias após o evento climático, as doenças que mais aparecem são as infecções de pele, as pneumonites ou pneumonias por aspiração, as infecções respiratórias virais e as gastroenterites (a popular diarreia).
O infectologista Alexandre Vargas Schwarzbold, professor da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, explica que muitos desses quadros estão ligados ao contato com a água contaminada.
"Inclusive, as doenças diarreicas são a maior causa de morte por questões infecciosas após desastres hídricos", afirma.
Os mais vulneráveis a essas infecções intestinais são as crianças muito pequenas e os mais velhos, grupos que merecem uma atenção especial para evitar quadros extremos de desidratação.
As infecções de pele também estão relacionadas a esse mesmo fenômeno — o contato com materiais contaminados das enxurradas.
Já as infecções respiratórias costumam ser consequência das aglomerações. Isso porque dezenas de milhares de pessoas estão em abrigos, muito próximas umas das outras. E essa condição facilita a transmissão de vírus causadores de resfriados, gripe e covid-19.
Segunda onda: leptospirose, tétano e hepatite A
Passados entre sete e dez dias das inundações, outras moléstias ganham força e relevância.
A principal preocupação aqui é a leptospirose, doença causada por uma bactéria transmitida a partir do contato com a urina de animais, principalmente ratos.
Muitas vezes, esse micro-organismo invade o corpo de uma pessoa lá atrás, no momento em que ela tem contato com a água contaminada. Mas há um tempo de incubação, ou um período em que o patógeno não dá sinais de sua presença, até que os primeiros sintomas deem as caras.
Geralmente, esse tempo de incubação da leptospirose é de 7 a 14 dias, mas pode se estender por até um mês.
Terceira onda: dengue
Por fim, algo que historicamente sucede as grandes inundações são as doenças transmitidas por vetores, como é o caso da dengue.
No entanto, a situação no Rio Grande do Sul em relação a esse problema de saúde é incerta, apontam os especialistas. Isso porque o mosquito transmissor, o Aedes aegypti, costuma ficar mais ativo quando a temperatura está elevada, durante o verão e a primavera.
E, em pleno outono, as cidades gaúchas começam a experimentar um clima frio — algo que o Aedes não curte tanto assim.
Por um lado, esse cenário pode significar menos casos de dengue nas próximas semanas.
No entanto, isso não permite que gestores e profissionais de saúde relaxem completamente em relação a essa doença.
Fonte BBC